17/12/2024

Brincar de bolhas


Em meados deste ano fui almoçar em uma feira de rua e vi adultos e crianças brincando de fazer bolhas de sabão. Fiquei encantado por diversos motivos, entre eles pelo fato da bolha ser tão delicada, fina, quase como a captura de matérias intangíveis (ar e luz). Acho que é o mais próximo que vamos chegar de ver magia a olhos nus.

Depois dessa experiência comecei a pensar sem parar em bolhas de sabão e, consequentemente, comecei também a desenhar e escrever sobre elas. Mas antes de ilustrar qualquer ideia, fui eu mesmo brincar com o que tinha: água, detergente, barbante e galhos de árvore. Esse aparato foi o suficiente para criar minhas próprias esferas cristalinas ao lado de casa numa tarde de domingo e, de quebra, levar para os meus aluninhos como atividade.


O mais interessante nessa brincadeira é que não é tão fácil soltar boas bolhas como parece. Assim como no desenho, precisei encontrar um gestual muito específico, afinal de contas, estou lidando com materiais delicados. O próprio corpo coordena os resultados - não só o vento ou a estrutura de gravetos e fios. É engraçado pois me vi num ciclo de repetição incessante: molhar as pontas, tirar com cautela, girar o tronco, segurar com firmeza e desprender bolha de hastes. Só algumas duravam.


A duração também é algo curioso: se está ciente logo de início que aquilo é completamente efêmero. O resultado não é tão importante pois, afinal de contas, as bolhas são feitas para estourar. É uma beleza que dura segundos. Acredito que esse caráter poético foi também o que me seduziu sobre a brincadeira. Enquanto adultos estamos habituados a investir esforços somente no que pode durar ou trazer retorno significativo. Fazer bolhas parece algo bobo nessa altura do campeonato, mas para mim foi um momento de repensar o apego, curtir o processo e não só o fim (que, nesse caso, foi muitíssimo adiantado).

Mesmo que eu aqui esteja atribuindo uma leitura a esse gosto desenvolvido - brincar de bolhas de sabão -, no final das contas é uma ocupação sem sentido, sem função considerável (mais uma vez, nessa idade é algo que sempre buscamos: funcionalidade). Acho importante nos ocuparmos de vazios, flutuarmos, nos darmos a permissão de sermos uma beleza viajante que reflete a luz.


De toda essa caminhada saiu uma ilustração da qual me orgulhei bastante. Aproveitei minha ida ao Rio de Janeiro e fiz impressões dela em risografia com os meninos do estúdio Risotrip. Em 2025 as cópias limitadas estarão à venda.

“Amar é brincar: Não leva a nada. Não é para levar a nada. Quem brinca já chegou” Rubem Alves


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