08/01/2025

Itirapina 2025


Mesa de desenho: materiais, frios e espumante

Entre os dias 03 e 07 de janeiro de 2025 eu, Bece e João Botas fizemos uma passagem pelo sítio deste último. Somos um trio de amigos artistas que se conheceram no instituto de artes da Unicamp e desde então combinamos nossos interesses e personalidades em pequenos e grandes encontros (alguns urbanos e, como neste mais recente, rurais). Apanhamos nossos materiais e nos retiramos por quatro dias no interior de Itirapina, entre pastos, matas, vacas, onças, javalis, caiporas e fogo-corredor.

Horta do sítio

Ao longo do recesso aproveitei para ficar longe das redes sociais, o que foi muito bom e me possibilitou ainda mais presença na programação que incluiu visita à Brotas, turismo no antiquário da cidade, trilha em mata fechada, cachoeiras, passeio à cavalo, comidas caseiras deliciosas e, claro, muitíssimas sessões de desenho com a Bece e João.

"Árvore da vida" 

Nossa primeira visita juntos ao sítio do Botas ocorreu em janeiro de 2024, exatamente um ano atrás. Foi interessante comparar como naquela fase não éramos tão íntimos quanto somos hoje e também a semelhança entre os roteiros que planejamos. Dessa vez pudemos produzir mais imagens inspiradas no que vimos e partilhamos nos diferentes cenários da viagem. Foi como mapear tanto a memória do ano anterior ao mesmo tempo que criamos uma cartografia mais fresca do campo que nos recebeu com tanta beleza.

 Respectivamente: buquê de hortaliças e flores do sítio, espigas de milho secando, galinhas da Dona Giva & retratos de João e Bece feitos por mim (enquanto esperávamos a vitória de Fernanda Torres)

Por sermos um grupo pequeno, composto por três artistas, foi tranquilo de nos organizarmos e combinarmos as vontades. Passamos grande parte do tempo em uma mesa larga, distribuímos nossos papéis, tintas, marcadores e outras ferramentas para narrar o que mais chamava nossa atenção. 

 Itens da cozinha do sítio

 Objetos vistos no antiquário de Itirapina

Pelo o que observei, Bece desenhou principalmente personagens: bonecas, figuras humanas, criaturas curiosas com formas engraçadas - e também preencheu com cenários do sítio parte do sketchbook que compramos juntos um dia antes da viagem (tomamos sorvete e também chuva entre a papelaria e a casa para pegarmos suas malas).

 Desenhos de Bece. Personagens que ela criou a partir das maritacas que se apossaram do forro da casa. Ouvíamos as famílias da ave o tempo todo passeando pelo telhado. Veja mais de seu trabalho aqui

João também tem sua assinatura própria em temas e formas de compor imagens. Suas peças maiores produzidas nas sessões de desenho incluem pinturas mitológicas de uma manga formando um altar e um peixe flechado por ele mesmo, tempo atrás, com direito a escrituras vernaculares. Bece fez uso principalmente de marcadores e lápis, enquanto João criou a partir de aquarela e tinta acrílica.

 João e seu peixe flecha. Em uma tentativa de caça, o João acabou flechando um pacu e tanto o peixe quanto a arma afundaram no rio. Veja mais de seu trabalho aqui

Minhas produções incluem natureza morta, animais e um pouco de cenário. Ilustrei também objetos que vi pelo antiquário e, provavelmente, meu saldo predileto: uma cena onde eu, Bece e João carregamos itens oriundos do sítio em uma espécie de fanfarra rural. Eu seguro uma sacola com alimentos da horta, Bece cavalga em uma galinha abraçando um ovo caipira e João coleta grãos e sementes pelo caminho.

 Respectivamente: eu (carregando verduras da horta), Bece (cavalgando uma galinha e abraçando um ovo caipira) e João (com um punhado de grãos e sementes

O fim do dia no campo é o momento mais bonito. Criei duas aquarelas pequenas para ilustrar a “hora dourada”: uma releitura da minha reação perplexa diante de um pôr-do-sol deslumbrante e a reprodução de um descanso que nos demos no deck do açude, onde observamos e alimentamos os peixes (e até pegamos alguns nas mãos). Foi curioso ver como os menores se aventuravam sem medo na superfície ao passo em que os maiores eram somente sombras mais ao fundo do lago.

 Vista para o pôr do sol

 Alimentando peixes no açude

Foi divertido e afetivo dividir esse momento com outros dois amigos. Observar como produzir junto de outras pessoas faz o tempo fluir e me leva ao mesmo estado de espírito de quando eu era criança e me sentava para praticar o desenho em turma, sem sentir pressão ou cair em labirintos de expectativas. É algo muito próximo da brincadeira, onde cada um habita seu silêncio - vezes interrompido por um comentário bobo, pedido de material ou intervalo dedicado a contemplar o que o colega está fazendo (e sair inspirado a retornar para sua própria folha de papel).

 Amoras

 Sapo comendo besouro

Sou filho único. Disse à Bece que sinto que essa experiência (de passar vários dias e noites com amigos) é o mais próximo que vou chegar de ter irmãos. Dividimos momentos mundanos como escovar os dentes na frente do espelho, sentar na cadeira depois do almoço e colocar os pés para o alto, não se importar com a própria aparência, jeito ou humor e também situações únicas como uma longa trilha em mata fechada que nos leva a uma cachoeira misteriosa e curativa.

 Carriola com maxixes

 Arizona, égua da irmã do João. Foi a primeira vez que cavalguei, ela era muito alta

Foi uma viagem pouco planejada, porém muito marcante. E talvez exatamente o fato de termos ido sem muitos planos que tornou a passagem pelo sítio tão espontânea e especial - só sabíamos que queríamos estar um com o outro naquele tempo e espaço. Foi um jeito mágico de começar bem 2025.

 Bece, João e Vienno, 2025

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